Projeto Amigo das Abelhas da Amazônia promove primeira oficina de meliponicultura para moradores de Boa Vista do Acará, Pará

Por Instituto Peabiru
Publicado em 19/11/2020

Mais de 30 famílias participaram da primeira oficina do projeto Amigos das Abelhas da Amazônia que abordou a biologia e o comportamento das abelhas melíponas

Famílias de Boa vista do Acará participam de oficina sobre meliponicultura, promovida pelo projeto Amigo das Abelhas da Amazônia. Foto: Instituto Peabiru/Mariana Faro


Em 1º de novembro o Instituto Peabiru promoveu a primeira oficina sobre meliponicultura (criação de abelhas sem ferrão) para moradores do município de Boa Vista do Acará. A oficina foi oferecida pela equipe do projeto Amigo das Abelhas da Amazônia para 32 famílias pré-selecionadas para participação no projeto, que terá duração de dois anos em seu primeiro ciclo.

A atividade faz parte do desenvolvimento do novo polo de meliponicultura no município de Boa Vista do Acará (PA), nas comunidades de Genipaúba, Boa Vista, Santa Maria e Itacuãnzizho, e conta com o apoio do Instituto Clima e Sociedade como financiador. O projeto selecionará 20 famílias para participar das atividades do projeto que irá contemplar os selecionados com 300 colmeias matrizes, fornecendo capacitação para início da criação de abelhas sem ferrão, assistência técnica, além da garantia de compra da produção local ao final do ciclo produtivo. Conhecidas como abelhas sem ferrão por conta do seu ferrão atrofiado, as abelhas melíponas geram uma série de produtos e serviços ambientais nas áreas onde são criadas, como o mel, o pólen e a polinização das plantas. Os méis das abelhas melíponas têm sabor único e são alimentos tradicionalmente obtidos da floresta por povos originários da Amazônia.

Sob as árvores famílias de Boa Vista do Acará puderem conhecer mais sobre as abelhas melíponas, sua organização e produção. Foto Instituto Peabiru.


A oficina foi ministrada pelo técnico Cleiton Santos, colaborador do Instituto Peabiru com mais de cinco anos de experiência no manejo de abelhas nativas. O objetivo da oficina, focada na biologia e no comportamento das abelhas, foi apresentar às famílias de Boa Vista do Acará noções iniciais sobre a criação de abelhas sem ferrão, incluindo os cuidados com as áreas de floresta onde as abelhas fazem a polinização e coletam seus alimentos. Cleiton apresentou informações sobre a organização das colmeias e a admirável sabedoria das abelhas, que fazem a construção, gestão e proteção das suas colônias. Também foram abordadas as condições de produção de mel pelas famílias, produto que terá sua compra garantida pelo Instituto Peabiru  ao final do ciclo produtivo. Segundo Cleiton, de cada potinho dentro das colmeias é possível tirar até 35ml de mel. A expectativa é que cada uma das 20 famílias participantes do projeto produza pelo menos 30kg de mel ao final de 2021. Quanto maior a florada, maior será a produção das abelhas sem ferrão.

Uma aula sobre as abelhas sem ferrão

A oficina apresentou informações interessantes e úteis para os potenciais meliponicultores de Boa Vista do Acará. Os participantes foram apresentados à classificação das abelhas na superfamília apoidea e à subfamília dos meliponíneos que se divide em duas tribos: meliponas e trigonas. Nativas do Brasil, em cada região do país há espécies específicas de abelhas, como é o caso do Rio negro, com as abelhas melipona rufiventris e do Rio Amazonas, com as melipona seminigra. Em Boa Vista do Acará as abelhas locais são as melíponas compressipes. Verdadeiras arquitetas, o ninho das abelhas melíponas é construído em forma de discos, onde pequenas células de cria são sobrepostas com pilares de sustentação entre os discos. Passeando por entre os discos de cria podemos ver as abelhas operárias, os machos, as rainhas-virgem e a rainha-mãe, esta responsável por produzir os ovos para o nascimento de novas abelhas.

Cleiton Santos, técnico do Instituto Peabiru, apresenta a uma parte dos participantes a estrutura interna das colmeias e tira dúvidas sobre a criação das abelhas. Foto: Instituto Peabiru.


Os participantes também aprenderam sobre ameaças enfrentadas e as defesas que as abelhas produzem em seus modos de organização. Quando as colônias estão maduras, as abelhas são fortes e sabem se proteger. Contudo, para que elas possam se desenvolver inicialmente é necessário bastante cuidado, “cuidar igual um bebê recém nascido”, ressalta Cleiton. É preciso verificar seu desenvolvimento periodicamente, avaliando se houve alguma interrupção ou ameaça, como predadores invadindo as colmeias ou queimadas próximas ao meliponário. As abelhas nativas não têm ferrão, mas são preparadas para viver na floresta e lidar com seus predadores e com ameaças na concorrência pelo seu alimento (especialmente o néctar, líquido coletado das flores). Mesmo sem ferrão elas defendem suas colônias, por meio de revoadas, e da proteção da entrada das colmeias com a produção de resina. Quando há ameaça de predadores, como formigas e lagartixas, elas se juntam na porta da colmeia para proteger a entrada. Mesmo depois do tubo de entrada, canal que compõe a estrutura das colmeias, nos túneis internos várias abelhas ficam de guarda para garantir a proteção da colônia.

A oficina abordou ainda os processos de reprodução das abelhas e também a multiplicação de suas colmeias. A reprodução pode acontecer através da enxameação, que ocorre quando as próprias abelhas realizam a divisão da sua colônia. Nesse processo elas visitam e escolhem um novo lugar, adequado e seguro, para morar e o preparam para a mudança. Quando o novo lar está pronto, se mudam em conjunto levando uma abelha virgem eleita para ser sua nova rainha e preparadas para fortalecer a nova casa. Cleiton explicou também as formas de evitar essa mudança independente, que é fazer, sempre que necessário, a reprodução da colmeia para que a colônia não fique muito cheia. Ele ressalta que o desenvolvimento das colmeias é lento, por isso o processo de criação considera sempre pelo menos seis meses para reprodução da colmeia e de um ano para produção do mel.

Interior das colmeias, onde as abelhas produzem o mel e diversos outros insumos.
Foto: Instituto Peabiru/Mariana Faro.


As abelhas e seus produtos variados

Com a oficina os participantes puderam conhecer uma série de lições de gestão e produtividade que as abelhas, em seu sofisticado sistema de organização e produtividade, compartilham conosco. Muito trabalhadoras, além de preparar suas próprias casas, elas também produzem uma gama de produtos ricos em nutrientes, como o própolis e o mel. Cada colmeia é capaz de armazenar até 4Kg de mel. No seu contínuo trabalho, elas chegam a voar até 2km em busca de alimentos, como o néctar e o pólen. Por isso, a oficina também destacou a importância de manter árvores nativas e frutíferas bem perto do meliponário, para que as abelhas fiquem menos cansadas na sua busca por néctar e pólen. Flores de árvores frutíferas, comumente cultivadas nos quintais, podem ser boas aliadas na criação das abelhas, como urucum, jambo, ingá, laranja, limão e  goiaba.

Alguns produtos das abelhas sem ferrão

NéctarO néctar é um líquido doce que há nas flores. As abelhas usam a língua para sugar o néctar que é transportado no papo de mel para dentro da colônia. Este néctar é desidratado e recebe as enzimas necessárias, transformando-se em mel, que é então armazenado nos potes de cerume.
PólenSão pequenos grãos responsáveis pela fecundação das flores. Fonte de proteína para as abelhas, o pólen é coletado com as patas ou por vibração das mandíbulas. As abelhas transportam o pólen na corbícula e o armazenam dentro dos potes de cerume.
ResinaAs abelhas colhem a resina que escorre das árvores, como a castanheira. A carga é armazenada na corbícula e transportada para a colônia. Dependendo da espécie de árvore que a abelha colheu a resina, esta pode ser empregada em misturas para a construção da colmeia ou, dependendo da qualidade, receber enzimas salivares para se transformar em própolis, que será misturado na cera pura, originando o cerume.
CeraTrata-se de pequenas escamas brancas que saem dos anéis do abdômen na parte de cima. Só as abelhas entre 5 e 11 dias de vida produzem cera.
PrópolisA abelha coleta resinas especiais em determinadas árvores e adiciona glândulas salivares para transformá-la em própolis, que será armazenado próximo à entrada e nos cantos da colmeia.
CerumeO cerume é a mistura de cera pura e própolis (resina vegetal). Utilizado para a construção de células de cria, cobertor do ninho (invólucro), potes de alimentos e na composição do geoprópolis.
GeoprópolisTrata-se da mistura de barro, sementes, própolis, cera e resina, utilizado na estrutura de entrada, construção dos batumes e no calafeto de frestas.
BatumeQuando as abelhas encontram um oco de árvore ou mesmo quando instalamos uma colônia em colmeia muito grande, estas abelhas limitam a parte de cima e a parte de baixo com uma grossa camada de geoprópolis, a estes tampões chamamos de batume. O batume superior é compacto para evitar a entrada de água e o batume inferior tem furinhos para, se preciso, permitir a saída de água.

Com informações do Manual de Meliponicultura. Edição especial para Meliponicultores Tradicionais, por Fernando Oliveira (2006).


Com uma parte da oficina sendo realizada em área onde estão instalados meliponários modelo, os participantes receberam também orientações práticas sobre a estrutura das caixas de abelhas e sobre como manter limpas suas áreas para instalação e manutenção dos meliponários. “A gente tem que manter limpos, não misturando a criação de abelhas com outras criações de animais, por exemplo” destacou Cleiton. Motivados pelos aprendizados da oficina e potencial da meliponicultura, as famílias da comunidade de Itacuãnzinho se mobilizaram e agendaram um grande mutirão para limpeza e adequação dos quintais, para definir se é possível manter a criação de porcos por perto dos meliponários.

Dona Dayse Sueli, de Jenipaupa, conhece os meliponários modelo e participou ativamente da oficina sobre a criação de abelhas sem ferrão.


Dayse Sueli,  moradora da comunidade de Jenipaupa, no ramal Santa Rosa, foi uma das mais participativas e ajudou inclusive a tirar dúvidas trazendo importantes questões sobre o cuidado com as abelhas. Animada, Dayse compartilhou suas impressões e destacou sua expectativa de poder participar do projeto. “O técnico já foi no meu sítio, fez a vista e marcou o ponto do GPS. Para mim a oficina de meliponicultura foi muito boa, aprendi muito. Pude saber como as abelhas vivem, cuidam da casa delas, produzem o mel e também como se reproduzem.” 

O projeto Amigo das Abelhas da Amazônia

Em outubro de 2020 o Instituto Peabiru convidou famílias e organizações comunitárias de Boa Vista do Acará a conhecerem a proposta do seu Programa de Abelhas da Amazônia, desenvolvido desde 2006. O Programa desenvolve projetos em parceria com organizações sociais de territórios da Amazônia para criação de abelhas sem ferrão, atividade que gera renda e promove educação ambiental. 

Próximos passos

Após a primeira oficina de meliponicultura, os técnicos do projeto também realizaram visitas técnicas para orientar as famílias pré-selecionadas sobre suas condições de participação. Entre as próximas atividades do projeto estão previstas: 

  • II Oficina de meliponicultura (montagem, alimentação e reprodução), em 22 de novembro de 2020.
  • Oficina de Gestão do Meio Ambiente, em 23 novembro de 2020
  • Oficina de assinatura de parceria, em dezembro de 2020
  • Construção dos meliponários (marcação, cavação, entrega e fixação de cavaletes, inspeção), em dezembro de 2020.
  • Entrega das matrizes, em janeiro de 2021.
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